SÃO GABRIEL WEATHER

BRIANE MACHADO

Cuidado com o Bicho-Papão

A infância é uma fase da vida em que tudo toma proporções maiores do que é necessário, uma vez que não temos dimensões adequadas para enfrentar o que é real e o que está somente no campo da imaginação.

Particularmente, desde criança eu tenho medo de espíritos, de alma penada - sim, ele aparece até hoje - e pode ser a maior bobagem, porém, ainda sinto a necessidade de apagar a luz e sair correndo ou de verificar se não há "ninguém" atrás de mim pelo corredor de casa.

Certa vez, tive medo de um pôster de uma banda que estava pregado na parede do quarto da minha prima - é que os rostos refletiam no feixe de luz e eu ouvi de outro primo que eles sairiam da parede durante a madrugada.

Com certeza, essas histórias da infância entre primos e amigos até hoje são lembradas com humor e nostalgia.

Ouvir os causos antigos contados por nossos pais, tios, avós nos deram certa aflição e, talvez, doses de coragem para enfrentar os reais medos impostos pela vida adulta.

Será mesmo que os medos foram embora ou apenas absorvemos a existência de cada um deles com o peso da idade que carregamos nas costas?

Já ouvi relatos de quem tinha medo das bonecas fluorescentes, de andar no escuro dentro de casa, de dormir com o pé destapado.

Eu jamais conseguirei dormir sem, pelo menos, oitenta por cento da cabeça coberta, pois eu penso que posso acordar e ter alguém me olhando e, geralmente, isso acontece após ouvir uma história macabra.

O "velho do saco", o "bicho-papão", "a loira do banheiro", a "Maria Sangrenta", o jogo do copo nos perseguiram durante o período escolar e só quem viveu sabe o que era chegar em casa sozinha depois da aula.

Com o passar do tempo, todas essas figuras lendárias foram extraídas da imaginação para ceder lugar aos medos reais.

De que você tem medo?

Com certeza, o "top 5" de todos nós tem a ver com saúde, carreira, amor, família e morte.

Hoje, mais do que nunca, a saúde vem em primeiro lugar. Acredito que todos estejam pensando em seu último hemograma, na taxa de Vitamina D e como vai a tireoide.

Com a saúde em dia, passamos a analisar como a carreira está se desenrolando - se é que está mesmo. Projeção de salário, de cargo, de função, gratificações, diplomas. Tudo vem em um compilado que tem o poder de nos acordar durante a noite, tal qual o medo do Bicho-Papão.

Não menos importante, temos a preocupação de estar com pessoas que nos amem e que, com certeza, não será um conto de fadas, nem entregue pela Fada Madrinha da Cinderela, mas será que vou conhecer esse amor genuíno até os 30 ou depois dos 60?

Logo vem a preocupação demasiada com os membros da família. Se todos estão bem, seguimos o fluxo. Acho que aqui se encaixa a consideração "Não casastes ainda?! Daqui a pouco ficará difícil ter filhos.". Gostaria tanto de incluir vários "emojis" aqui para representar a minha expressão facial quando ouço algo do gênero.

Logo, temos medo de não aproveitar o presente chamado vida - não somente em sua lógica temporal - e nos despedirmos cedo demais.

A vida adulta nos traz inúmeros questionamentos que ocupam lugares desnecessários nos pensamentos e aparecem, principalmente, às 3 horas da manhã como um despertador.

De tudo isso, começo a pensar que o Bicho-Papão e as almas penadas estavam somente nos preparando para o futuro. É que eu prefiro pensar que os pesadelos e dragões fizeram parte do estágio que nos preparou a enfrentar um mundo nem sempre tão amistoso.

No fundo, sobrevivemos a todas essas lendas. Somos corajosos para enfrentar os monstros reais.

Temos sorte que hoje existe cama box e, ali, ninguém se esconde.

Mas, não custa cobrir os pés ao dormir.

  

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